Análise: Jair Bolsonaro no Jornal Nacional

Assim como havia acontecido com o pedetista Ciro Gomes no dia anterior, os apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos optaram por perguntas voltadas mais para a polêmica

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MICHEL COSTA

Dando sequência à série de entrevistas com os candidatos à presidência da República mais bem posicionados nas pesquisas eleitorais, o Jornal Nacional entrevistou nesta terça-feira Jair Bolsonaro do PSL. Assim como havia acontecido com o pedetista Ciro Gomes no dia anterior, os apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos optaram por perguntas voltadas mais para a polêmica do que para as soluções de cada programa.

O primeiro tema tratado foi a postura de Bolsonaro que se coloca como novo no cenário político mesmo estando no sétimo mandato e com os filhos ingressos na carreira. Como resposta, o ex-capitão disse que nunca fez parte do núcleo corrupto da política e que sempre foi “baixo clero” em Brasília e que seus filhos foram votados porque o povo acreditou neles. Na oportunidade, lembrou da fala de Joaquim Barbosa, ex-ministro do Supremo, qualificando-o como um dos únicos parlamentares que não aceitou dinheiro do Partido dos Trabalhadores para votar em projetos na Câmara dos Deputados.

Permanecendo no tema, Renata Vasconcellos lembrou o patrimônio declarado por Bolsonaro, cerca de R$ 2 milhões, boa parte dele, conquistado durante os seus mandatos. Em sua defesa, Bolsonaro disse que não recebeu dinheiro de empresas, leia-se propina.

A seguir, no primeiro momento de tensão na sabatina, Bolsonaro se defendeu do recebimento de auxílio-moradia possuindo imóvel em Brasília, declarando que esse auxílio era tão legal quanto o recebimento na forma de pessoa jurídica, o “pejotinha”, da dupla de apresentadores. Aparentando irritação, Renata disse que eles não eram funcionários públicos, ouvindo de volta que as Organizações Globo recebem bilhões de reais em propaganda oficial do governo.

No curto espaço dado para economia, Bolsonaro falou sobre a relação de confiança com o economista Paulo Guedes e, questionado sobre eventuais desentendimentos futuros, o presidenciável protagonizou uma cena inusitada que deve ter arrancado risadas em muitos lares brasileiros ao lembrar que tanto ele quanto Bonner eram separados e que ninguém se casa pensando em uma “mulher reserva”. Neste instante, ficou bastante claro que Bolsonaro se defenderia das perguntas partindo para o ataque.

O clima quente permaneceu no estúdio quando Renata Vasconcellos relembrou a diferença salarial entre homens e mulheres, algo que, segundo o IBGE, está na casa dos 25%. Bolsonaro insistiu na tese que a igualdade já está prevista na CLT, mas que entende que cumpri-la não é tarefa do presidente da República. O candidato negou que concordasse com a diferença, contudo, há uma entrevista no programa SuperPop em que Bolsonaro diz isso claramente (5’32”).

Indo além, Bolsonaro indicou os jornalistas como exemplo de diferença salarial, sem dizer que Bonner recebia mais. Renata então afirmou que “nunca aceitaria receber menos que um homem para exercer a mesma função”. Neste caso, cabe informar que Bonner, além de apresentador, é editor-chefe do Jornal Nacional há 22 anos.

Quando o assunto passou a ser direitos trabalhistas, Bonner citou o comentário atribuído a Bolsonaro que os trabalhadores teriam que escolher entre ter mais direitos e ter emprego e perguntou quais direitos seriam retirados. Na defensiva, Bolsonaro disse que essa é uma fala de empresários, todavia, o apresentador lembrou que o presidenciável a repete como se concordasse com ela. Em seguida, mencionaram o voto contrário à “PEC das domésticas”, cuja justificativa seria o desemprego gerado pelos encargos, tese que, segundo dados do IBGE, não se sustentou posteriormente.

No entanto, o momento mais errático do candidato aconteceu no tema homossexualidade. Bonner e Vasconcellos citaram declarações de Bolsonaro ao dizer que ter um vizinho gay desvaloriza imóvel, que não queria ter um filho gay e associações entre homossexualidade e pedofilia. Apesar de negar ser homofóbico, Bolsonaro falou que “um pai não quer encontrar seu filho brincando de boneca” e se defendeu dizendo que age para proteger as crianças. Na sequência, ao citar o “9º Seminário LGBT Infantil”, que na verdade foi o “9º Seminário LGBT”, cujo tema era “Infância e Sexualidade” e apresentar um livro que não foi adotado pelo MEC como o “kit-gay”, Bolsonaro desinformou o público fazendo uso de dois episódios que não aconteceram como ele descreveu.

Quando o assunto passou a ser segurança pública, Bolsonaro relembrou que tanto ele quanto Bonner foram vítimas da violência urbana e que esta deve ser combatida à altura, com o policial de posse de armamento superior ao do bandido. Mencionou ainda o “excludente de ilicitude” para as mortes provocadas por policiais que, segundo o candidato, merecem ser condecorados e não processados.

O derradeiro momento de tensão aconteceu quando Bonner recordou as declarações do general da reserva, Hamilton Mourão, vice da chapa de Bolsonaro, que havia dito a um grupo de militares que se os poderes teriam que buscar solução, caso não conseguissem, chegaria a hora que o exército teria que impor a solução. Para Bolsonaro isso foi um alerta do seu vice, em caso de caos social e lembrou que isso já aconteceu no Brasil em 1964. Diante da tentativa de correção histórica de Bonner, o candidato citou Roberto Marinho, fundador das Organizações Globo, que em 1984 reafirmou o apoio o regime. Neste ponto, onde ninguém tem razão, o melhor resumo talvez seja o famoso refrão que diz “a verdade é dura, a Rede Globo apoiou a ditadura”, mesmo tendo feito um mea-culpa tardio, 10 anos após a morte de seu fundador.

Após a mensagem de despedida de Jair Bolsonaro, quando este falou em Deus, que o país precisa de um candidato honesto e que é preciso união entre todas as classes e regiões do País, restou a impressão que seu discurso saiu fortalecido entre as pessoas que defendem seus posicionamentos, ao passo que aqueles que discordam enxergaram novamente o candidato que rechaçam. Quanto ao Jornal Nacional, pela segunda vez, a opção pelo confronto lamentavelmente esvaziou a entrevista deixando de lado as propostas do candidato.

* Michel Costa, 42, mineiro, casado e formado em administração

Autor: Brasil Decide

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